Artigo: ‘Educação profissional para a juventude’

Por Cristiane Patinho, secretária de juventude da CUT Rio

A juventude era um segmento invisível na sociedade brasileira, quando muito contabilizada pelas estatísticas oficiais que encobriam a realidade juvenil. A tendência hegemônica das políticas públicas de juventude implantadas no Brasil visa minimizar os impactos da exclusão social e do capitalismo competitivo.

Não podemos negar a dificuldade do jovem trabalhador em inserir-se no mercado de trabalho cada vez mais competitivo e com postos de trabalho precários. Quanto mais precoce é a inserção da população jovem no mercado de trabalho, maiores são os desafios para o jovem trabalhador compatibilizar seu tempo de trabalho com o tempo de estudo.

Pesquisas mostram que os principais fatores que levam o jovem a sair da escola são a oportunidade de emprego (42,2%), para os homens, e a gravidez (21%), para as mulheres, o que implica o aumento da responsabilidade dessas pessoas e exige desses jovens maior atenção para a qualificação profissional (IPEA, 2008).

Com o agravamento da crise política no Brasil, e consequentemente, da crise econômica que tem afetado o mercado de trabalho, intensifica-se a visão da juventude como problema social. Como resposta para o desemprego juvenil, o capital e governos conservadores adotam medidas que focalizam apenas a inserção do jovem mercado de trabalho.

Respeitar os direitos mínimos da Constituição Federal é cada vez mais difícil, quanto mais respeitar o Estatuto da Juventude no momento atual de total desrespeito ao Estado Democrático de Direito.

Por outro lado, a partir de uma investigação sobre as políticas públicas destinadas aos jovens no Brasil. Spósito & Carrano (2003), apontam que, com a eleição de Luiz Inácio Lula da Silva à presidência da República em 2002, além das expectativas de mudanças propostas para seu governo, tornou-se preciso considerar o conjunto de iniciativas pré-existentes direcionadas à promoção da cidadania juvenil. Percebeu – se claramente significativos avanços na sociedade no que concerne a percepções em torno dos direitos de juventude, com base em uma concepção democrática de realização da política e de uma clara defesa dos jovens como sujeito de direitos.

A formação da classe do jovem trabalhador deve atender uma política social dentro do capitalismo contemporâneo, visando à socialização da política como meio de difundir a idéia de democracia e incorporando a ciência e a tecnologia no processo produtivo.

A formação para o trabalho não deve ser apenas uma prática educativa que qualifica e atualiza conceitos e conteúdos técnicos, como já ouvimos falar da “Educação Profissional”. Devemos investir na formação humana, para o domínio técnico-científico e filosófico, respeitando sua diversidade e o meio cultural. Hoje temos como grandes ameaças à nossa formação, a Escola da mordaça e a MP 746 do Ensino Médio e incluindo no pacote de maldades a Pec 55.

Nesse sentido, a formação para o trabalho é concebida como uma prática educativa que se dá tanto no âmbito da escola regular e no âmbito das instituições de ensino profissionalizante. Esta perspectiva rompe de uma vez por todas com a visão dicotômica entre formação para o trabalho e escolarização, entre trabalho e educação, que tem predominado em nossa sociedade.

Não podemos esquecer que o capitalismo sempre foi e sempre será o motivo das disputas hegemônicas evidenciando as lutas de classe, e consequentemente, atingindo na política de educação básica e educação profissional para atender os interesses da sociedade de mercado.

A intervenção sindical tem seu papel importante no que se refere na formação profissional, surgindo dois projetos distintos: na ótica do capital e na ótica do trabalho. Ambos têm como pressuposto a aplicação da ciência e da tecnologia no processo de produção.

A ótica do trabalho compreende desde as habilidades técnicas necessárias ao domínio dos novos conteúdos do trabalho até os conhecimentos teóricos que favoreçam a compreensão do processo de trabalho em seu conjunto.

Enquanto que na ótica do capital, o aumento do nível educacional de base científica e tecnológica reduz o nível de parcela da classe trabalhadora e sua qualificação para os postos de trabalho, com o objetivo de aumentar a produtividade no processo produtivo, impondo limites aos trabalhadores, através da socialização desigual do conhecimento científico e tecnológico – o que configura o monopólio do conhecimento.

Desse modo, de acordo com a ótica do capital, a formação para o trabalho baseia-se na distinção entre formação para o trabalho manual para a grande massa de trabalhadores e formação para o trabalho intelectual para uma elite privilegiada. No entanto, para ambas as parcelas da força de trabalho, a educação tem como objetivo a constituição de um novo tipo de trabalhador voltado para o mercado, quer como sujeito empreendedor, quer simplesmente como sujeito de consumo.

No século XIX, ao refletir sobre a relação entre o desenvolvimento da maquinaria e a indústria moderna, Marx (1994), já afirmava que a base técnica da indústria era revolucionária, enquanto todos os modos anteriores de produção eram essencialmente conservadores.

Considerando as análises das “Cartas do Cárcere” feitas por Nosella (1992), Antonio Gramsci apresenta grandes preocupações com as questões didático-pedagógicas, que correspondiam à sua concepção de vida, de cultura, de filosofia, de história, segundo a qual o ser humano deve educar-se científica e culturalmente até os níveis mais complexos, sofisticados e modernos. Esta visão tem como pressuposto uma forte e vital ligação com sua base popular e com seu senso comum. Esta concepção educacional seria o que, no presente trabalho, consideramos aquela da ótica do trabalho.

A educação voltada para a formação de um técnico abstrato, um intelectual desenraizado, ou seja, não orgânico, considerada aqui como aquela da ótica do capital, significaria uma ameaça para a aliança revolucionária. E, assim compreendido, quando a classe trabalhadora conquista o poder político, a tendência é a adoção de ensino tecnológico, teórico e prático, nas escolas dos trabalhadores.

Uma proposta alternativa ao do capital seria unificar a formação básica e a formação técnico-profissional como estratégia política. O que não ocorrerá com esse desgoverno conservador, que na verdade, deseja a todo custo fazer o apartheid social, começando pela educação, onde propõem absurdas mudanças, que fica visível a privatização de serviços básicos com direito universal e subjetivo garantido pela Constituição de 1988.

Na ótica do trabalho, há o conceito de “escola desinteressada do trabalho” se distingue do conceito de “escola do trabalho” por não significar uma escola que está preocupada em satisfazer interesses imediatos, em proporcionar a aquisição de habilidades operacionais para a produção industrial e por não ser uma escola do emprego. A “escola desinteressada do trabalho” seria uma escola preparatória (elementar e média) que conduziria o jovem até as mais amplas possibilidades de escolha profissional e não apenas a um ofício, preocupando-se em formar homens e mulheres como pessoas capazes de pensar, de estudar, de dirigir ou de controlar quem dirige a sociedade. A “escola desinteressada do trabalho” coincide com a “escola do trabalho” apenas por fundamentar seu processo de ensino/aprendizagem na aplicação direta e objetiva da ciência e da tecnologia em processos produtivos.

O novo cenário conservador anuncia grandes mudanças e perdas significativas para a classe trabalhadora. As tais reformas na política da educação profissional básica e de nível técnico e tecnológico, tende a formar um novo tipo de trabalhador para atender as exigências no mercado. Contudo, é inevitável o desemprego e a dificuldade para o jovem trabalhador inserir-se no primeiro emprego.

Neste contexto, o movimento sindical cumpre um papel relevante no combate às políticas públicas de qualificação profissional para a população jovem que visam exclusivamente à acomodação das camadas subalternas com a finalidade de mediar os conflitos de classes e manter a hegemonia do projeto ultra neoliberal.

Referências Bibliográficas:

IPEA. Políticas sociais: acompanhamento e análise. Brasília: IPEA, 2008. 310 p.

IPEA. Trabalho e Renda. Políticas sociais acompanhamento e análise, nº 15, p. 141-159, mar./2008.

MARX, Karl O Capital: crítica da economia política. Tradução de Reginaldo Sant‟Ana. 14ª Edição. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1994. Vol. I [Livro I – o processo de produção do capital].

NOSELLA, Paolo. A Escola de Gramsci. Porto Alegre: Artes Médicas, 1992.

SPOSITO, Marília Pontes; CARRANO, Paulo César Rodrigues. Juventude e políticas públicas no Brasil. In: Revista Brasileira de Educação. Rio de Janeiro: Editora Autores Associados, nº 24, p. 16-39, set./out./nov./dez., 2003.

Com base no artigo: TRABALHO, JUVENTUDE E QUALIFICAÇÃO PROFISSIONAL: A PEDAGOGIA DA HEGEMONIA DAS POLÍTICAS DE INCLUSÃO DE JOVENS NO
BRASIL. Do Doutor em Sociologia pela UNICAMP e professor de Economia Política da Educação do Instituto Multidisciplinar da UFRRJ, José dos Santos Souza.

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