Do Direito à Educação

Vivemos num momento da história do Brasil em que a sociedade enfrenta grandes desafios no tocante à cidadania. Não só o Brasil, mas também o mundo passam por grandes transformações. É importante tomar conhecimento sobre estas realidades para entender o que significam ou implicam na garantia de um futuro melhor para todas as pessoas que habitam o oikos.

Grandes temas apresentam-se com maior ênfase no debate em âmbitos acadêmicos. No cenário brasileiro, a questão da laicidade do Estado, os debates em torno de democracia e colonialidade, a aplicação de políticas econômicas neoliberais e o crescimento das intolerâncias tem sido alguns dos temas de debate urgente. Talvez em termos macro, podemos citar o fenômeno das migrações que vem provocando novas discussões em relação à geopolítica e seus confrontos.

Em meio a tantos desafios que se impõem no tocante à garantia e manutenção de direitos, o direito à educação é um desses espaços que jamais perderão sua atualidade. A educação escolar/universitária é fundamental para a construção de pessoas cidadãs que visa à participação destas em todos os espaços sociais e políticos.

Trata-se de um direito reconhecido no Estatuto da Juventude, especial¬mente no artigo sétimo, onde consta: “O jovem tem direito à educação de qualidade, com a garantia de educação básica, obrigatória e gratuita, inclusive para os que a ela não tiveram acesso na idade adequada.”

Também o artigo oitavo é importante nesse sentido: “O jovem tem direito à educação superior, em instituições públicas ou privadas, com varia¬dos graus de abrangência do saber ou especialização do conhecimento, observadas as regras de acesso de cada instituição.

§ 1o É assegurado aos jovens negros, indígenas e alunos oriundos da escola pública o acesso ao ensino superior nas instituições públicas por meio de políticas afirmativas, nos termos da lei.
§ 2o O poder público promoverá programas de expansão da oferta de educação superior nas instituições públicas, de financiamento estudantil e de bolsas de estudos nas instituições privadas, em especial para jovens com deficiência, negros, indígenas e alunos oriundos da escola pública.”

É preciso, no entanto, que o Estatuto seja garantido em caráter nacional. Ao mesmo tempo, é inegável a dificuldade que se apresenta diante da desigualdade social para instaurar rupturas e um regime de igualdade política de forma a diminuir discriminações e intolerâncias.

Todos os avanços no campo da educação e de acesso por parte das juventudes foi fruto de lutas empenhadas por uma concepção democrática de sociedade em que se objetiva a igualdade de oportunidades para todas as pessoas. A educação é um instrumento de luta com o qual se pode criar condições para gerações menos injustas. Podemos citar aqui o grande educador Paulo Freire e sua obra Educação como prática da liberdade. Freire foi quem se permitiu falar sobre as palavras “democracia, justiça e liberdade” de forma a acreditar nelas enquanto garantidoras da paz social. Afirma também que a democracia e a liberdade se darão de forma plena apenas a partir do momento em que se tem uma sociedade em que existem condições políticas, econômicas e sociais para tal.

Neste contexto, por exemplo, o Projeto de Lei PLS 193/2016 de autoria do Senador Magno Malta, que trata da “Escola Sem Partido” (ou Escola de Pensamento Único) significa um projeto que, na prática, silencia vozes, busca estabilidades e cria novos espaços de conforto e conformismo social, cultural e intelectual. O diferente e a diversidade incomodam. Discutir as desigualdades sociais, o feminismo, a discriminação sexual, entre outros assuntos, é provocar instabilidades nesse sistema de histórias e pensamentos únicos. Doutrinação ideológica está presente nas escolas desde sempre com seus conteúdos, com seus discursos, com suas relações. Dessa forma, educar é um ato político em si.

Cabe então salientar que vivemos em uma sociedade que tem por definição a pluralidade, o convívio e a diversidade. Nesse sentido, fazer do direito à educação um direito de todas as pessoas aponta para a valorização e adoção de políticas públicas que visam à inclusão para a promoção de práticas educacionais que envolvem relações com a família e a comunidade.

Neste debate cabe, ainda, de modo geral, problematizar a definição das fronteiras do campo religioso e nas relações entre religião, sociedade e Estado. Para as religiões, no entanto, é desafio constante, também no campo da educação, saber qual o seu lugar na sociedade, noção esta que coloca em jogo a constituição e o papel do Estado.

Estamos, assim, com o argumento da laicidade do Estado no que tange à relação entre religião e Estado.

Em termos gerais, e na linguagem de Freire, “Seria uma atitude ingênua esperar que as classes dominantes desenvolvessem uma forma de educação que proporcionasse às classes dominadas perceber as injustiças sociais de maneira crítica”. A educação é, portanto, um ato político num país que se quer democrático. Quer assim propiciar a todas as pessoas instrumentos necessários para seu auto entendimento, bem como no coletivo. Enquanto tal requer também equidade no acesso e igualdade de condições para que todas as pessoas possam usufruir a vida em plenitude.

(Ezequiel Hanke é facilitador da Rede Ecumênica da Juventude (REJU) no Rio Grande do Sul. Doutorando em Teologia pelas Faculdades EST, São Leopoldo/RS)

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