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Cerca de 1500 quilombolas se reúnem no Piauí para celebrar ancestralidade em encontro de Casas de Terreiros
21 de junho de 2024

“Por muito tempo, meus antepassados foram impedidos de expressar suas manifestações culturais. Este aqui é um espaço nosso. Um encontro para celebrar nossa ancestralidade.” A fala é de Jeisy Holanda. A jovem quilombola vive no Quilombo Custaneira, em Paquetá (PI). Entre os dias 7 e 9 de junho, o território recebeu o encontro “Ancestralidade e vivências: VIII Encontro Nacional de Casas de Terreiros de Comunidades Quilombolas”.
Com maioria absoluta de quilombolas, cerca de 1500 pessoas de mais de 200 comunidades do Piauí e também de outros estados como Goiás, Bahia, Maranhão e Distrito Federal passaram pelo Quilombo para celebrar suas ancestralidades. A iniciativa recebeu apoio da CESE através do Programa de Pequenos Projetos.


O encontro teve como principal objetivo proporcionar um momento de escuta aos mais velhos, de repasse e reafirmação dos saberes quilombolas. Um momento de troca cultural entre comunidades, terreiros e mesmo docentes e discentes do meio acadêmico. Um momento celebrativo e formativo da cultura negra.
Jeisy é Secretária da Associação de Desenvolvimento Rural Quilombola de Custaneira, responsável pela realização do evento juntamente com a Coordenação Estadual das Comunidades Quilombolas do Piauí (CECOQ-PI). Ela, que foi uma das organizadoras do evento, pontua a importância de ver os mestres da academia ouvindo o que seus mestres e ancestrais têm a dizer.

“Quando estamos em outros espaços, nós é que temos nossas vozes limitadas. Foi incrível eles estarem aqui como ouvintes, interessados em conhecer nossos saberes.” Nesse contexto, entram as diversas rodas que foram realizadas ao longo do encontro, com temas como “O Saber Ancestral confluindo pelo tempo em diálogo com a natureza” ou mesmo sobre agroecologia, sustentabilidade e plantas medicinais.
“Tivemos as oficinas sobre o uso das palhas. Essa foi voltada mais para as crianças que sentaram e ali aprenderam um trançado, tiveram contato com essa cultura, com essa forma de artesanato que vem se perdendo. E a palha está envolvida não somente no artesanato, mas na nossa vida como um todo. Desde a moradia à forma de renda e à própria medicina natural”, explica Jeisy.

Apesar do nome do encontro enfatizar a relação com as Casas de Terreiros, ela afirma que o encontro não encerra na religiosidade. “Garantimos o espaço para a gente construir e conversar sobre direitos humanos, aquilo que a gente quer e como podemos avançar em pautas que são fundamentais para o nosso povo.”
Jeisy fala da importância de ter conseguido apoio da CESE para a realização da oitava edição do encontro. “Tudo que a gente conseguiu até o encontro do ano passado foi através da luta, da resistência e da teimosia de nossas comunidades. Então eu acredito que o apoio da CESE vem como providência da ancestralidade mesmo. Para que a gente entenda que estamos no caminho certo. Que temos apoio de instituições que se importam e respeitam a nossa causa”, finaliza.
VEJA O
QUE FALAM
SOBRE NÓS
A luta antirracista é o grande mote das nossas ações que tem um dos principais objetivos o enfrentamento ao racismo religioso e a violência, que tem sido crescente no estado do Maranhão. Por tanto, a parceria com a CESE nos proporciona a construção de estratégias políticas e de ações em redes, nos apoia na articulação com parcerias que de fato promovam incidência nas políticas públicas, proposições institucionais de enfrentamento a esse racismo religioso que tem gerado muita violência. A CESE nos desafia na superação do racismo institucional, como o grande vetor de inviabilização e da violência contra as religiões de matrizes africanas.
Somos herdeiras do legado histórico de uma organização que há 50 anos dá testemunho de uma fé comprometida com o ecumenismo e a diaconia profética. Levar adiante esta missão é compromisso que assumimos com muita responsabilidade e consciência, pois vivemos em um país onde o mutirão pela justiça, pela paz e integridade da criação ainda é uma tarefa a se realizar.
A CESE foi criada no ano mais violento da Ditadura Militar, quando se institucionalizou a tortura, se intensificaram as prisões arbitrárias, os assassinatos e os desaparecimentos de presos políticos. As igrejas tiveram a coragem de se reunir e criar uma instituição que pudesse ser um testemunho vivo da fé cristã no serviço ao povo brasileiro. Fico muito feliz que a CESE chegue aos 50 anos aperfeiçoando a sua maturidade.
Parabéns à CESE pela resistência, pela forte ancestralidade, pelo fortalecimento e proteção aos povos quilombolas. Onde a política pública não chega, a CESE chega para amenizar os impactos e viabilizar a permanência das pessoas, das comunidades. Que isso seja cada vez mais potente, mais presente e que a gente encontre, junto à CESE, cada vez mais motivos para resistir e esperançar.
Eu preciso de recursos para fazer a luta. Somos descendentes de grupos muito criativos, africanos e indígenas. Somos na maioria compostos por mulheres. E a formação em Mobilização de Recursos promovida pela CESE acaba nos dando autonomia, se assim compartilharmos dentro do nosso território.
Celebrar os 50 anos da CESE é reconhecer uma caminhada cristã dedicada a defesa dos direitos humanos em todas as suas dimensões, comprometida com os segmentos mais vulnerabilizados da população brasileira. E valorizar cada conquista alcançada em cada luta travada na busca da justiça, do direito e da paz. Fazer parte dessa caminhada é um privilégio e motivo de grande alegria poder mais uma vez nos regozijar: “Grande coisas fez o Senhor por nós, e por isso estamos alegres!” (Salmo 126.3)
A família CESE também faz parte do movimento indígena. Compartilhamos das mesmas dores e alegrias, mas principalmente de uma mesma missão. É por um causa que estamos aqui. Fico muito feliz de poder compartilhar dessa emoção de conhecer essa equipe. Que venham mais 50 anos, mais pessoas comprometidas com esse espírito de igualdade, amor e fraternidade.
Comecei a aproximação com a organização pelo interesse em aprender com fundo de pequenos projetos. Sempre tivemos na CESE uma referência importante de uma instituição que estava à frente, na vanguarda, fazendo esse tipo de apoio com os grupos, desde antes de outras iniciativas existirem. E depois tive oportunidade de participar de outras ações para discutir o cenário político e também sobre as prioridades no campo socioambiental. Sempre foi uma troca muito forte.
A gente tem uma associação do meu povo, Karipuna, na Terra Indígena Uaçá. Por muito tempo a nossa organização ficou inadimplente, sem poder atuar com nosso povo. Mas, conseguimos acessar o recurso da CESE para fortalecer organização indígena e estruturar a associação e reorganizá-la. Hoje orgulhosamente e muito emocionada digo que fazemos a Assembleia do Povo Karipuna realizada por nós indígenas, gerindo nosso próprio recurso. Atualmente temos uma diretoria toda indígena, conseguimos captar recursos e acessar outros projetos. E isso tudo só foi possível por causa da parceria com a CESE.
Conheço a CESE desde 1990, através da Federação de Órgãos para Assistência Social (FASE) no apoio a grupos de juventude e de mulheres. Nesse sentido, foi uma organização absolutamente importante. E hoje, na função de diretor do Programa País da Heks no Brasil, poder apoiar os projetos da CESE é uma satisfação muito grande e um investimento que tenho certeza que é um dos melhores.