CESE dá início ao II Ciclo de Formação “Gbani – Autoproteção Comunitária e Cuidados Digitais”

Dando sequência aos encontros iniciados em 2020, a CESE – Coordenadoria Ecumênica de Serviço inicia o II Ciclo de Formação “Gbani – Autoproteção Comunitária e Cuidados Digitais”. O projeto é voltado para lideranças vinculadas a organizações quilombolas dos estados do Pará, Tocantins e Maranhão e é executado em parceria com a MariaLab e a AATR – Associação de Advogados/as de Trabalhadores/as Rurais.

O Gbani conta com apoio da Fundação Ford e tem por objetivo sensibilizar e contribuir para o fortalecimento de ferramentas para a gestão autônoma dos riscos e da segurança comunitária na luta por direitos – defesa do território, do coletivo/comunidade, da pessoa e também por cuidados digitais. Para este ano, sua programação prevê a realização de três webinários, três rodas de conversa e uma formação sobre cuidados digitais.

As formações serão organizadas em dois focos: autoproteção comunitária e cuidados digitais. Seus conteúdos serão distribuídos em 10 módulos durante o período de execução desta formação. Em cada módulo haverá atividades a serem executadas pelas/os participantes e a conclusão destas atividades será condição para que se avance rumo ao encerramento do Ciclo

Em cada módulo serão disponibilizadas áudio-aulas, acompanhados de cards de apresentação e um resumo explicativo – o material ficará disponível on-line e poderá ser baixado e acessado depois. Em 2020, foram disponibilizadas 10 áudio-aulas e realizados sete encontros: três webinários, três formações (um para cada estado) e uma roda de conversa.

Viviane Hermida, Assessora de Projetos e Formação da CESE, destaca que a formação nas áreas de autoproteção comunitária e cuidados digitais foi apontada como prioridade no diálogo com as organizações quilombolas devido ao aumento de ataques aos povos tradicionais que atuam na defesa de direitos de suas comunidades, seja diretamente ou com ameaças e monitoramento de pessoas através de celulares e redes sociais.

“Então buscamos parceiras/os que têm bagagem nessas temáticas para tentar auxiliar as organizações nesses aspectos. A formação é um espaço para refletir sobre práticas tradicionais de autoproteção que devem ser retomadas nesse novo contexto, mas também para apropriação de ferramentas, como planos aplicativos mais seguros, planos de viagem e dinamização de redes de proteção”, afirma.

Rosana Fernandes, Assessora de Projetos e Formação da CESE, ressalta que “o Gbani é fruto de diálogos entre a CESE e o movimento quilombola, no qual o autocuidado comunitário e os cuidados digitais se colocam como fundamentais nestes tempos sombrios de pandemia, ataques a democracia, violações de direitos e criminalização das organizações e seus dirigentes”.

“Soma-se ainda para as comunidades quilombolas, o enfrentamento às diversas formas de expressão do racismo e às desigualdades históricas, o acesso à comunicação. A CESE compreende estes desafios e busca contribuir de forma concreta, para que o movimento quilombola se fortaleça para avançar na defesa dos territórios e dos direitos dos negros e negras das comunidades rurais do nosso país”, finaliza.

Uma das mulheres quilombolas* que participam das formações conta que lideranças de sua comunidade já foram atacadas e ameaçadas virtualmente. “Houve situações que ocorreram dentro da comunidade e tomaram proporção enorme, com essa visibilidade fizeram calúnias e distorceram os fatos em que a comunidade estava envolvida”, relata. E é por isso que ela decidiu participar dos encontros.

“Estou participando do ciclo de debate porque acredito que seja muito importante conhecer e aprender mais sobre autoproteção comunitária e segurança digital. Nós quilombolas vivemos em lutas constante, seja no território ou fora dele, e quanto mais tivermos acesso a meios e ferramentas que possam nos ajudar na proteção e valorização dos nossos, mais fortalecidos ficamos”, pontua.

Outro homem quilombola* conta que, apesar de não ter sofrido ou presenciado nenhum tipo de ameaça virtual em sua comunidade, ele também não hesitou em participar dos cursos. “Topei logo que me convidaram! Haja visto que as ferramentas digitais são muito importantes se nós sabemos usá-las a nosso favor. Nossos quilombos são muito carentes de formações digitais. Tenho certeza que irei poder contribuir muito com nossos quilombos”, afirma.

Segundo Beatriz Cardoso, integrante da Associação de Advogados/as de Trabalhadores/as Rurais e formadora nesses encontros, o conteúdo que será passado aos/às cursistas tem por objetivo proporcionar-lhes uma melhor reflexão sobre autoproteção comunitária e estratégias para momentos antes e depois de ocorrerem eventuais incidentes.

“Esse conteúdo sempre foi importante para qualquer movimento social ou organização popular. Mas a gente tem um contexto ainda mais complexo: pelo momento violento que vivemos, que há esse ódio dirigido às organizações, mas também por essa conjuntura de redes sociais. Há novas formas de ataque. Isso faz com que a gente precise repensar as estratégias de proteção. No contexto que vivemos, fica ainda mais importante”, destaca.

Para Maria*, integrante da MariaLab e também formadora durante as formações do Gbani, é sempre importante falar sobre segurança. “Com a pandemia, a nossa vida ficou muito virtualizada. Todas as conexões políticas acabaram ficando restritas ao ambiente digital. Isso abre muitas lacunas de segurança por que somos um país com um acesso precário à internet e muito monopolizado por alguns grupos”.

Ela complementa sua fala dizendo que esse curso funcionará como forma de sensibilização sobre segurança digital. “Vamos falar sobre como se reunir de forma segura, trocar mensagens com segurança. Nosso objetivo é ajudar essas lideranças a lidar com as ferramentas para que elas possam acionar uma rede de apoio caso seja preciso”.

*Essas pessoas tiveram seus nomes modificados ou ocultados por questões de segurança