Curso de incidência política impulsiona ações de mobilização do Coletivo Incomode

No dia 18 de junho, centenas de jovens caminharam do bairro do Lobato até o Parque São Bartolomeu em protesto contra o genocídio e hiperencarceramento da juventude negra da Bahia, na Marcha INCOMODE.  Organizada pelo Coletivo INCOMODE, a marcha aconteceu pelo segundo ano consecutivo, levando inúmeras famílias a reclamar os reincidentes casos de homicídios e desaparecimentos de jovens durante as operações realizadas nas comunidades periféricas de Salvador.

O ato público teve como impulso para sua concretização a Formação em Incidência Política, da qual jovens do Coletivo Incomode participaram no ano de 2017. O curso foi promovido pela CESE em parceria com Terre des Hommes Schweiz e Terre des Hommes Suisse, com apoio de Wilde Ganzen, dentro do Programa Virando o Jogo. Estiveram presentes 20 jovens representantes de organizações parceiras de TdH, oriundos de três regiões do Nordeste (Bahia, Pernambuco e Paraíba).

“O que levou a gente a organizar a marcha foi uma provocação do curso de incidência política. Na época, levamos nossa problemática, mas não tínhamos pensando em uma ação específica. Então a gente decidiu criar uma caminhada que denunciasse a opressão policial, uma caminhada que buscasse aquilombar as organizações de juventude e as organizações que desenvolvem trabalho com juventude na luta contra esse processo de violência, de extermínio, de genocídio da população negra”, explica Eduardo Machado, do Coletivo Incomode.

Na finalização da caminhada, os jovens se reuniram no Parque São Bartolomeu para apreciar as apresentações artísticas dos grupos presentes. Poesia, dança e hip hop marcaram o encerramento da Marcha com mães, familiares e amigos de vítimas.

Diante dos frutos que a formação rendeu, Eduardo destaca que “quando o jovem passa por um curso de incidência política, ele se torna mais qualificado para o enfrentamento das violências correlatas do racismo e do patriarcado. Então esse jovem se torna uma ferramenta no combate a essas estruturas”.

Para Alexandre Menezes, coordenador nacional da Terre des Hommes Schweiz, a formação em incidência política contribui para que os jovens possam reivindicar seus direitos. “Os jovens são as sementes do futuro. Se a juventude tem acesso à qualificação, visão mais crítica, política, mais apurada de como preparar uma campanha ou de como promover uma audiência pública, isso irá influenciar em como eles estarão fortalecidos para conquistar direitos”.

CPI do Extermínio

Como desdobramento, está em trâmite na Assembleia Legislativa da Bahia o projeto para a criação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI), que vai investigar o extermínio de jovens negros na Bahia. “A gente conseguiu iniciar esse processo isso por meio de ações de incidência política: realizamos quatro audiências públicas, três na Assembleia e uma de caráter popular”, informa Eduardo, que relata que o Coletivo está em fase de mobilização dos deputados e parlamentares.

“Uma CPI serve pra cobrar uma postura do estado. Para nós, a Comissão Parlamentar de Inquérito é um dos principais objetivos de conquista. Até o fim do ano, vamos fazer campanhas para pressionar os parlamentares para aprovar essa CPI, da mesma forma como a gente conseguiu a aprovação do Estatuto da Igualdade Racial no município (o Coletivo Incomode esteve inserido naquele processo também). O Estatuto só foi aprovado porque fizemos pressão diante da Câmara”, pondera o integrante do Coletivo Incomode sobre os efeitos das ações de incidência para o fortalecimento de direitos da juventude negra do Subúrbio Ferroviário de Salvador.

Dados – Juventude Negra

Segundo o Atlas da Violência 2019, produzido pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) e pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, a Bahia é um dos 15 estados brasileiros que apresentam taxas de homicídio de jovens acima da média nacional. Enquanto o Brasil apresenta o índice de 69,9 assassinatos a cada 100 mil jovens, a Bahia registra a taxa de 119,8 homicídios, considerando o mesmo quadro amostral.

O estudo também mostra que, em 2017, 75,5% das vítimas de homicídios no Brasil foram pessoas negras (soma de indivíduos pretos ou pardos, segundo classificação do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE). De 2007 a 2017, a taxa de homicídio de negros cresceu 33,1% no País; a de brancos apresentou crescimento de apenas 3,3%.

Jovens e negros são também maioria entre a população carcerária no Brasil, que em 2016 chegou a um total de 726,7 mil, segundo dados do Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias (Infopen). Mais da metade desse segmento era formado por jovens de 18 a 29 anos e 64% do total eram negras.

(Com informações da Revista Quilombo)