Mulheres indígenas mobilizam recursos para fazer participação política

 Com apoio da CESE, mulheres Sateré Mawé participaram em peso da II Marcha das Mulheres Indígenas em Brasília

As mulheres indígenas Sateré Mawé estão mais empoderadas e participando ativamente das discussões políticas na arena pública e dentro da aldeia. Uma prova disso é que 12 dessas mulheres participaram da Segunda Marcha das Mulheres Indígenas, cujo tema foi “reflorestando mentes para a Cura da Terra”, realizada de 7 a 11 de setembro de 2021, em Brasília. A marcha teve um papel crucial no enfrentamento direto ao projeto do Marco Temporal, que estava sob votação no Superior Tribunal Federal e deverá ser retomado no primeiro semestre de 2022.

Com apoio da CESE, através do Programa de Pequenos Projetos, dentro da Metodologia de Dupla Participação, a Associação de Mulheres Indígenas Sateré Mawé deslocou suas integrantes para o evento estratégico na defesa dos direitos dos povos originários no Brasil.

O povo Sateré Mawé vive no Amazonas. Na primeira edição da Marcha, contou apenas com uma representante no evento. Nesse segundo encontro, Samela Sateré Mawé esteve ao lado de mais 11 companheiras do seu povo e numa delegação de 60 mulheres indígenas amazonenses, que batalharam para mobilizar recursos e ter condições adequadas para participar do evento – estratégico tanto nas lutas pelos direitos dos povos originários, quanto especificamente no recorte de gênero, assegurando questões específicas das mulheres.

“Nosso povo é patriarcal e até pouco tempo atrás, as mulheres nunca saiam da aldeia ou participavam das decisões. Ir em maior número para eventos como a marcha representa uma mudança”, revela a liderança feminina”. Segundo ela, “um dos saldos da participação na marcha e todo processo que antecedeu ao evento, desde a captação de recursos através do edital e complementações necessárias, contribuiu para o fortalecimento e empoderamento das mulheres Sateré Mawé”.

Segundo Samela, as mulheres indígenas estão protagonizando as lutas e trazendo seu tom para o debate. “Estamos mais fortes, com nossas vozes ecoando nacional e internacionalmente. Já é reconhecida a força das mulheres indígenas e que, para nós, a luta pela terra é a mãe de todas as lutas. Porque para gente a terra é como nós, é mulher, dá casa, chão, nutre. O território é uma mãe”, explica a jovem, que percebeu mudança sensível nos espaços de debate e negociação, que hoje se abrem para escuta e participação ativa das mulheres. “Nós lutamos há muito tempo. A gente conquista alimento, a gente prepara as crianças e as protege até entrarem na faculdade. A gente luta para que possam permanecer nas faculdades e assim, possam defender nossos direitos. E para nós, tudo isso é luta e é conquista” afirma.

Metodologia Dupla Participação – A participação maior de mulheres Sateré Mawé foi viabilizada pelo Programa de Apoio a Pequenos Projetos da CESE, que possibilitou a compra das passagens de avião e condições para acampar em Brasília. A associação foi contemplada na categoria Metodologia de Dupla Participação, modalidade em que a organização precisa mobilizar até 50% do valor do projeto e a CESE dobra o valor arrecadado. A estratégia adotada pela Associação de Mulheres Indígenas Sateré Mawé foi a organização de uma vaquinha para levantar os recursos.

A estratégia foi exitosa porque implicou a comunidade e parceiros externos – o empenho coletivo garantiu as condições para arrecadar recursos, além de afirmar a capacidade própria de mobilização de recursos por parte do grupo. “Foi uma experiência muito importante para nós, porque conseguimos engajar as pessoas e nunca tivemos uma participação tão grande. Contribuiu para ficarmos mais fortalecidas” conta Samela.

A Associação existe desde 1992, mas assim como outras organizações indígenas, enfrentou diversos desafios para conquistar a institucionalização e criar as condições para captar recursos e seguir trabalhando. “A CESE tem nos apoiado demais e tem sido fundamental para nós conseguirmos regularizar a associação institucionalmente. Participamos do Programa de Fortalecimento Institucional e isso foi fundamental para darmos os passos necessários para recuperar o CNPJ, negociar as dívidas e fortalecer a entidade” compartilha a tesoureira da associação.

Para Samela, o saldo que ficou dessa experiência foi avançar algumas casas em direção ao fortalecimento da participação política e capacidade de incidência. “Hoje temos mulheres mais articuladas, totalmente atenta às pressões que precisamos fazer para impedir os avanços das políticas desse governo, a exemplo do Marco Temporal que poderá ser votado. A gente compreende o valor da nossa presença e organização para impedir que propostas que nos retiram direitos sejam feitas sem enfrentamento” conclui a liderança indígena feminina.

As mulheres Sateré Mawé já estão com os olhos no futuro: em 2023 tem a III Marcha das Mulheres Indígenas e até lá, muito trabalho pela frente envolvendo protagonismo feminino e combate às violações de direitos, desmatamento, projetos de mineração, denunciar os impactos das mudanças climáticas, as violências contra as mulheres dentro dos territórios, entre outros temas. Trabalho árduo. E coragem elas têm de sobra.

No início da Associação de Mulheres Sateré Mawé, a pauta das mulheres indígenas envolvia as condições de trabalho nas cidades, com frequentes violências nas casas de família em que trabalhavam, envolvendo impedimentos de falarem sua língua materna ou expressarem sua cultura livremente. As mulheres também tinham os desafios do afastamento dos filhos, o que era uma questão de impacto para toda comunidade.

A associação promove a autoafirmação e a independência financeira das mulheres, por meio da fabricação e venda de artesanatos, visando estimular sua autonomia. Também está no campo de ação da organização a defesa de direitos como educação, saúde, cultura e a autoafirmação de jovens indígenas em âmbito acadêmico e mulheres em situação de vulnerabilidade.