Unidas pela ancestralidade, mulheres indígenas da Amazônia levantam suas vozes em defesa de seus direitos, na luta por respeito e valorização de suas culturas diante das crescentes ameaças que enfrentam.
O encontro “Mulheres Indígenas da Amazônia” é uma das atividades do projeto “Patak Maymu: Autonomia e participação das mulheres indígenas da Amazônia e do Cerrado na defesa de seus direitos”. Realizado entre 11 e 13 de setembro em Macapá, Amapá, pela CESE com apoio e financiamento da União Europeia.
O evento reuniu 25 representantes, de 11 organizações de mais de 13 povos, entre eles Wapichana, Taurepang, Karipuna, Waiãpi, Tiriyó e Piratapuya.
Abordou temas como a luta antirracista das mulheres indígenas em diversos espaços que ocupam, ações de comunicação realizadas pelo projeto Patak Maymu que potencializam e visibilizam as vozes das mulheres indígenas, validação do mapeamento de comunicadoras indígenas, além dos desafios e estratégias desenvolvidas na área da comunicação pelas organizações indígenas e pelas mulheres. Também foram abordadas caminhos para o fortalecimento das organizações e elaboração de projetos sociais.
Raízes de força: Fortalecimento de mulheres indígenas
O fortalecimento e a autonomia das mulheres indígenas são essenciais para que suas vozes e lutas sejam reconhecidas. As organizações indígenas desempenham um papel crucial, promovendo a união e o desenvolvimento de estratégias coletivas.
“Participar desse encontro é fundamental para o nosso fortalecimento institucional entre as organizações indígenas de mulheres. Aqui, pudemos conhecer a trajetória de cada uma, destacando que nossas lutas são comuns: a defesa do território, a segurança alimentar e o enfrentamento da crise climática que vivemos”, relata Cleocimara Reis Gomes, do Povo Piratapuya-AM.
No encontro, estavam presentes indígenas que não falavam português, mas puderam se comunicar devido à tradução realizada por uma participante voluntária. Essa iniciativa não apenas facilitou a troca de ideias, mas também fortaleceu os laços entre as participantes, garantindo que todas as vozes fossem ouvidas e respeitadas.
Merlane Tiriyó, ativista feminista do povo Tiriyó-AP, que fez a tradução, destaca a importância de encontros como esse, que possibilitam a participação de indígenas que não falam português. Ela afirma: “Espero que futuras atividades desse tipo contem com tradutores para povos que não falam português. Ao incluir mulheres que não compreendem a língua, junto com aquelas que entendem, mostramos que estamos unidas.”
Ao fortalecer suas redes, capacidades e habilidades, as mulheres indígenas se tornam protagonistas na luta por direitos, construindo um futuro mais justo e sustentável para suas comunidades.
Ocupar para transformar: Mapeamento de Comunicadoras Indígenas
Outro momento importante foi a apresentação dos resultados do Mapeamento de Comunicadoras Indígenas, divulgado em 5 de setembro, data que celebra o Dia Internacional da Mulher Indígena, o Dia da Amazônia e a semana do Dia do Cerrado (11). O mapeamento destaca a atuação das mulheres indígenas, a partir de uma visão abrangente de suas habilidades, experiências e necessidades. Essa ação é essencial para promover a visibilidade e fortalecer as vozes dessas mulheres na comunicação.
O encontro também contou com o apoio de Joyce Aniká, jovem comunicadora indígena do povo Karipuna, que fez a cobertura fotográfica da atividade. Ela comenta: “O mapeamento de comunicadoras é uma iniciativa nova e muito interessante, pois valoriza a comunicação. É importante balancear tantos dados relevantes em uma pesquisa, isso nos ajuda a desenvolver uma consciência para cuidar e ampliar nossas linhas de comunicação.”
Esse foi um momento em que as mulheres puderam entender como funcionou o mapeamento, tirar dúvidas, fazer sugestões e conhecer como a Cese visibiliza ainda mais suas vozes e potencializa suas narrativas.
“Sabemos dos anseios e das dificuldades das mulheres indígenas por estarem trazendo a sua língua para o meio da comunicação, além de como se comunicar e levar as informações de seu território para o mundo. Isso é visibilidade, um reconhecimento que fortalece as comunicadoras indígenas”, afirma Keilliane Wapichana, do Conselho Indígena de Roraima (CIR).
Para Kelliane, a comunicação não se resume a um meio de informação; ela é uma ferramenta essencial para capacitar lideranças femininas, que lutam para defender seus territórios, pela demarcação de terras indígenas e sustentabilidade dentro de suas comunidades.
Intercâmbio Cultural: Fomentando diálogos e fortalecendo identidades
Além das atividades mencionadas, durante os dias de encontro, no dia 11, foi realizada uma visita ao Forte São José, em parceria com a ação Tapiri Ecumênico e Inter-religioso. A programação incluiu, também, uma vivência no quilombo do Ambé, proporcionando um rico intercâmbio cultural. Essa experiência permitiu que os participantes conhecessem as tradições, desafios e histórias da comunidade.
O quilombo do Ambé tem 214 anos, com 77 casas em todo o seu território e tem uma forte tradição em que é comemorada a festa de seu padroeiro, São Roque, no dia 16 de agosto. Foi reconhecida pela Fundação Cultural Palmares como “comunidade quilombola” em 2006.
No Amapá, comunidades quilombolas enfrentam ameaças a seus territórios por especulação imobiliária, o que desorganiza sua estrutura social e limita o acesso a recursos essenciais. No quilombo do Ambé, a situação é ainda mais agravada pela precariedade dos serviços locais, incluindo um posto de saúde sem equipamentos e medicamentos e uma escola de ensino fundamental que não está devidamente equipada para receber os estudantes.
“Com 56 anos ter ido na comunidade, ouvir um de nossos anfitriões falar, ver pessoas conhecidas, foi maravilhoso. Esse encontro (Tapiri), foi de excelência, reunir todas as religiões me deixou muito feliz, enquanto mulher preta e filha de quilombo, foi ótimo essa vivência”, relata Raimunda Coutinho de Souza, do grupo de economia criativa solidária Mãos Unidas.
Keiliane Wapichana, do Conselho Indígena de Roraima, fala da relevância de ter visitado o quilombo e como as histórias ouvidas se assemelham às narrativas indígenas. Enfatiza a importância de reconhecer essas interconexões, e destaca que as lutas pela demarcação territorial e pela educação refletem dores semelhantes. “Estamos unidas na defesa de nossos direitos e na busca por um futuro mais justo para nossas comunidades“, afirma.