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Habitualmente afastados/as dos sistemas de proteção social e negados seus direitos fundamentais, imigrantes e refugiados/as convivem com xenofobia, e atualmente, enfrentam novos desafios com a pandemia do Covid-19. Em entrevista, Roque Renato Pattussi e Carla Aguilar, do Centro de Apoio e Pastoral do Migrante, descrevem os reflexos da pandemia sobre imigrantes e refugiados/as.

A pandemia carrega consigo as marcas das desigualdades e à medida que avança no Brasil, vai deixando cada vez mais certas populações em posição mais vulneráveis. Entre os grupos mais susceptíveis aos efeitos do novo Coronavírus estão as pessoas em situação de refúgio e os/as imigrantes que deixaram seus locais de origem para fugirem de crise econômicas e políticas, desastres ambientais, guerras e perseguições.

Segundo o Comitê Nacional para os Refugiados (Conare), o Brasil possui cerca de 1,2 milhões de imigrantes internacionais, 43 mil pessoas reconhecidas refugiadas e 193 mil solicitantes de refúgio. A cidade de São Paulo concentra o maior número dessas populações, 360 mil pessoas e mais de 150 nacionalidades.

Habitualmente afastados/as dos sistemas de proteção social e negados seus direitos fundamentais, os/as imigrantes convivem com xenofobia, e atualmente, enfrentam novos desafios com a pandemia do Covid-19. É o que relata  representantes do Centro de Apoio e Pastoral do Migrante (CAMI), organização que trabalha há mais dez anos no atendimento e na promoção dos direitos humanos junto à comunidade imigrante. Segundo a organização, estima-se existência de 400 mil imigrantes pobres em situação de vulnerabilidade, em sua maioria haitianos e africanos que chegam na condição de refúgio e vivem, em sua maioria, nas ocupações de São Paulo, onde o CAMI atua.

Em conversa com a Coordenadoria Ecumênica de Serviço (CESE), Roque Renato Pattussi, coordenador do CAMI e Carla Aguilar assistente social da organização, descrevem os reflexos da pandemia sobre imigrantes e refugiados/as, e a importância do apoio da CESE logo no início da crise epidêmica.

Para além das circunstâncias críticas enfrentadas pelos/as brasileiras/as vulneráveis ao Covid-19, essas populações se defrontam com as diferenças culturais, barreiras linguísticas, racismo e discriminação. Roque Pattussi afirma que a pandemia trouxe à tona temas direcionados os/as imigrantes e refugiados/as que antes estavam velados e cita frases comumente dirigidas as essas pessoas: “Os imigrantes chineses e venezuelanos trouxeram o Covid-19, o Sarampo, a Febre Amarela. Então, não queremos mais imigrantes aqui”, ou “Vamos mandar embora todos estes/as imigrantes/as que só trazem desgraças”, exemplifica o coordenador do centro.

Para Carla Aguiar, essas populações enfrentam grandes dificuldades de acesso às políticas sociais no Brasil nesse período: “As políticas públicas não funcionam bem para brasileiros, muito menos para imigrantes e refugiados/as.”, afirma. Segundo a assistente do CAMI, entre os desafios enfrentados durante a pandemia que circunscrevem o cotidiano desses/as indivíduos, estão as questões relacionadas ao trabalho, aos cuidados da saúde e a educação. Existem problemas de relocação no mercado formal de trabalho e quando há empregabilidade as condições trabalhistas não são adequadas; No caso da saúde, dificuldade de acesso, despreparo profissional, precarização e xenofobia são fatores que demonstram o risco adicionais que estão submetidos/as no contexto epidêmico; Sem falar na inviabilidade da educação à distância para crianças pela falta de acesso à internet e acompanhamento direcionado.

Além disso, a organização expõe a precariedade das condições financeiras de refugiados/as e imigrantes intrínseca ao deslocamento emergencial do país. A maior parte dessa população sustenta suas vidas e de suas famílias através do mercado informal, e com as medidas de isolamento perderam suas fontes de renda. Nesse contexto, muitos/as acabam vivendo nas ruas ou em comunidades periféricas sem infraestrutura básica que garanta seus direitos fundamentais.

Outra singularidade que se destaca é a questão da falta de documentação. Segundo a integrante do Centro de Apoio e Pastoral do Migrante, a indocumentação agrava todos os problemas e traz consequências direitas à vida das pessoas: “Hoje temos pessoas que estão passando fome porque não foram anistiados e sem documentos, não têm sequer o direito de matar a fome através do auxilio emergencialOs alimentos para matar a fome chegam somente pelas Igrejas e pelas ONGs como o CAMI”, relata Aguillar.

E Pattussi descreve a importância do apoio da CESE neste cenário: “A CESE foi a primeira instituição que diante da Pandemia se preocupou com os imigrantes e refugiados/as. Fez contato conosco para saber o que estava se passando com eles/as naquele momento, pediu um relatório e buscou apoio para dar esperança de que juntos/as iríamos superar este momento. Este olhar sensível levou o CAMI a presentear muitas famílias com alimentos, mas, não somente com comida, e sim, com esperança.”, revela o representante da organização.

Leia a entrevista completa:

CESE: Como a pandemia tem impactado a vida de imigrantes e pessoas em situação de refúgio?

ROQUE PATTUSSI: A pandemia trouxe à tona temas direcionados aos imigrantes e refugiados que antes estavam velados, como: xenofobia, discriminação, intolerância. Além de casos de ódio contra essas populações. Como por exemplo:“Os imigrantes chineses e venezuelanos trouxeram o Covid-19, o Sarampo, a Febre Amarela. Então, não queremos mais imigrantes aqui”, ou “Vamos mandar embora todos estes imigrantes que só trazem desgraças”, entre outros.

Além destes temas, ainda tivermos grandes impactos na fome, desemprego, falta de materiais de limpeza e higiene para prevenção; Não acesso ao auxilio emergencial; Despejo de inúmeras famílias; Mortes de imigrantes e refugiados/as pelo Covid19; Dificuldade de acesso ao atendimento na saúde; Não acesso de muitas famílias de imigrantes às escolas onde os filhos estavam estudando.

Os impactos são muitos. Parece que a definição da palavra “vulnerável” se ampliou com a pandemia ganhando mais força na sua origem. E podemos sentir como os imigrantes e refugiados/as ficaram vulneráveis em seu psicológico e social, pois muitos/as tinham seus trabalhos informais, porém esse trabalho informal era o que garantia a pão de cada dia em sua mesa que já não era farta, garantia o pagamento do aluguel no final do mês. Muitos/as perderam suas casas, passaram a morar com familiares, amigos ou na rua. Os imigrantes e refugiados/as sempre tiveram dificuldades em ter acesso a condições dignas de moradia e vida, e aos mínimos direitos fundamentais garantidos. Muitos/as ainda têm o problema com a documentação vencida, tornando-os/as irregulares. Mais um desafio para ser vencido.

CESE: Há impactos positivos?

ROQUE PATTUSSI: Houve impactos positivos gerados pela pandemia, como maior unidade entre os/as imigrantes e apoio uns/as aos outros/as; Envolvimento das comunidades de imigrantes para arrecadar e distribuir alimentos, e a busca ativa por famílias passando necessidades; Aumento do número de lideranças nestas comunidades; Mais nativos/as defendendo as garantias e acessos de imigrantes e refugiados/as aos direitos; Muito mais pessoas e famílias conhecendo o CAMI e buscando apoio para documentação e de todos os serviços que a instituição oferece gratuitamente; Oferta de alimentos para famílias brasileiras necessitadas e com isso uma valorização da presença dos imigrantes. E aparecimento do grande contingente de imigrantes indocumentados que eram invisíveis.

CESE: Além dos desafios vivenciados pelas populações vulnerabilizadas, migrantes e refugiados/as enfrentam a questão da indocumentação. Por que a regularização de documentos se torna mais urgente nesse contexto da pandemia?

CARLA AGUILLAR: Infelizmente, não foi aprovada a Anistia junto com a Nova Lei de Migração no ano de 2017, pedido realizado por todas as organizações da sociedade civil ligadas aos imigrantes, para igualar todos/as em direitos. Infelizmente isto não aconteceu e deixou suas chagas agora na pandemia. O Governo vetou o pedido da Anistia e outras propostas que levariam direitos para essas pessoas, como o voto.  Hoje temos indivíduos que estão passando fome porque não foram anistiados e sem documentos, não têm sequer o direito de matar a fome através do auxílio emergencial. Os alimentos para matar a fome chegam somente pelas Igrejas e pelas ONGs como o CAMI.

O RNM–Registro Nacional Migratório, se transformou em um pedaço de papel, sem foto. Não é reconhecido nem pelos serviços públicos. Então, como esta pessoa vai conseguir trabalho?   O atendimento na sede da polícia federal foi suspenso desde o dia 18 de março, porém, há três anos estamos enfrentando dificuldades para acessar o sistema para agendamento dos/as que precisavam dar entrada na sua residência ou para renovar seus documentos. A Nova Lei de Migração impõe uma multa de $100,00 reais por dia para pessoa irregular no país.

Sem documentos, imigrantes e refugiados/as têm acesso limitado à saúde, apesar do SUS ser Universal. Ou seja, urge que o governo do Brasil faça uma Anistia ou uma rápida regularização dos/as imigrantes ou solicitantes de refúgio, para que possam exercer seu direito de lutar conta o Covid-19. Documentar é existir. Sem documento as pessoas não existem.

CESE: Como tem sido a atuação do governo brasileiro no que se refere à implementação de políticas públicas para refugiado/as ou o acesso a direitos, em especial o direito ao trabalho, à saúde e à educação?

CARLA AGUILLAR: As políticas públicas não funcionam bem para brasileiros, muito menos para imigrantes e refugiados/as. Não basta oferecer acesso aos serviços públicos aos migrantes, urge neste tempo, fazê-lo com rapidez e qualidade, de forma a assegurar os direitos humanos e sociais básicos e possibilitar a eles/as uma vida com dignidade. No trabalho, por exemplo, mesmo alguns imigrantes podem trabalhar formalmente, mas há muitas dificuldades para conseguir um trabalho formal e quase sempre as propostas são para pagar menos ou produzir muito mais do que antes da pandemia.

No caso da saúde, em se tratando dos migrantes e refugiados/as a universalidade nem sempre é respeitada, infelizmente. Teve um caso que o imigrante mesmo insistindo que não estava bem, com sintomas de Covid-19, não foi levado em consideração. Três dias depois faleceu com a doença. O desrespeito, o despreparo e a falta de empatia se tornaram muito recorrentes na pandemia. Na educação, agora ficou muito difícil o aprendizado. A maioria não tem acesso à internet, não tem computador e nem celular para poder acompanhar as aulas. Por outro lado, os pais também não estão preparados para ajudar nas aulas on-line.

CESE: Qual a importância do apoio da CESE ao “Projeto Apoio emergencial devido à pandemia COVID-19” neste momento?

ROQUE PATTUSSI: Queremos iniciar dizendo da nossa GRATIDÃO pela aproximação da CESE ao CAMI, aos imigrantes e refugiados/as, da rapidez e sensibilidade com que trataram este momento e o acompanhamento dado ao tema durante este momento.

A CESE foi a primeira instituição que diante da Pandemia se preocupou com os imigrantes e refugiados/as. Fez contato conosco para saber o que estava se passando com eles/as naquele momento, pediu um relatório e buscou apoio para dar esperança de que juntos/as iríamos superar este momento. Este olhar sensível levou o CAMI a presentear muitas famílias com alimentos, mas, não somente com comida, e sim, com esperança.

As famílias se sentiram recordadas, incluídas num programa de solidariedade e com mais ânimo para pensar em outras possibilidades. Podemos dizer que o apoio da CESE ao nosso projeto foi vital, pois mostrou-se sensível à causa dos invisíveis, nos ajudou a estruturar todo nosso trabalho e nos transformou como instituição num centro de apoio e de distribuição de alimentos e esperança. A princípio pensamos que conseguiríamos poucas cestas básicas para ajudar imigrantes e refugiados/as, mas o apoio nos levou a abrir caminhos para irmos junto a outros/as parceiros/as. E assim chegarmos a mais de 4 mil famílias contempladas até hoje.

CESE: Além do apoio recebido pela CESE, o CAMI tem se articulado com outras organizações e realizado outras iniciativas, como campanhas virtuais para doação de leites, cestas básicas, materiais de proteção e produtos de higiene e limpeza. Vocês já têm um balanço do alcance do trabalho de vocês durante a pandemia?

CARLA AGUILLAR: Foram 4.515 cestas entregues; 100 famílias atendidas com alimentos orgânicos; 4.515 Kits de limpeza (água sanitária, álcool em gel, sabão em pó); 1.600 kits de higiene; 4.600 mascaras de proteção; 130 pacotes de fraldas descartáveis; 3.964 mulheres; 551 homens e 2.702 crianças.

CESE: Para além das doações, como tem sido a atuação do CAMI neste contexto do novo Coronavírus?

ROQUE PATTUSSI: A Pandemia virou a mesa e nos obrigou a nos reinventar e inovar. A fome atacou em cheio nossos/as atendidos/as desde a primeira semana da pandemia pois, sem documentos, sem auxilio emergencial, sem trabalho, os/as imigrantes e refugiados/as não tinham com quem contar.

O primeiro passo foi captar recursos somente para comida e buscar parceiros/as para juntos/as criarmos uma rede solidária. Encontramos um grupo de 42 coletivos da comunidade boliviana e africana, que nos chamaram para liderar todos através do coletivo Bolívia Solidária, uma vez que tínhamos a experiência e técnicos preparados para lidar com esse tipo de situação. Criamos desde a primeira semana, um Comitê de Crise da Pandemia, para olhar cada uma das necessidades dos/as imigrantes e refugiados/as e para pensar em soluções. Desde o primeiro dia, transformamos todos os nossos atendimentos de forma virtual para proteger também nossa equipe do Covid-19.  E definimos com o comitê a criação de equipes para apoiar nas demandas e desafios que estavam nascendo: Equipe das questões em relação da documentação; Logística para distribuição de cestas básicas; Assistência Social e Assessoria Jurídica: Oficinas de Costura; Comunicação; e Cursos Online.

CESE: Como as pessoas podem colaborar com o trabalho do CAMI nesse momento?

CARLA AGUILLAR: Estamos prevendo que esta situação se manterá por um período bastante longo ainda. Por isso, tem importância vital a indicação do CAMI para outras instituições financiadoras. Estamos prevendo que esta situação se manterá até a chegada da vacina. Como os/as imigrantes serão os últimos a serem contemplados/as com a retomada do trabalho, prevemos que os meses de sofrimento e necessidade será maior do que para brasileiros/as.

O CAMI usou muito dos seus recursos do fundo de reserva que seriam para contrapartida dos projetos para o ano de 2021, transformando em alimentação, produtos de higiene e limpeza e que ainda estamos doando para as famílias. Segue as formas de contribuição para recomposição desse fundo:

Doações nos bancos:

Banco do Brasil/ Ag: 0383-2/ Cc: 46077-x.

E Itaú S/A/ Ag: 0609/ C.c: 0042568-1

CNPJ 19.122.009/0001-01 – CAMI – Centro de Apoio e Pastoral do Migrante

Doações pessoais

Av. Nothmann, 485 – Campo Elíseos – São Paulo/ Telefone: (11) 333.0847/ Atendimento Segunda-feira: de 14h às 17h | Sexta-feira: de 14h às 17h

Doação de créditos da Nota Fiscal Paulista

No ato da compra, informe o CNPJ do CAMI, no lugar de seu CPF, como forma de doação de créditos da Nota Fiscal Paulista. Caso algum estabelecimento comercial se recusar a aceitar o CNPJ do CAMI (19.122.009/0001-01) no ato da sua compra, você pode fazer a doação de suas notas fiscais – basta trazer o cupom fiscal a um dos projetos do CAMI.