Movimentos de Mulheres do Nordeste compartilham experiências e estratégias de mobilização de recursos em curso promovido pela CESE

Coco babaçu, pote de mangabas, anel de coco, bengala guia, echarpe com figura de olhos, artesanatos, barco de papel, fio de contas, pente afro, bandeira, bandana, camisa, livros, caderno, caneta e microfone. Esses foram os símbolos de luta trazido pelas mulheres durante a abertura do Curso sobre de Mobilização de Recursos para organizações da Comunidade de Prática, realizado pela CESE, por meio de uma plataforma online.

O encontro tem como objetivo: contribuir para ampliar o reconhecimento da importância dos recursos locais/nacionais; apresentar novas ferramentas para a gestão e mobilização de recursos locais; e promover a partilha de experiências entre os movimentos de mulheres do Nordeste da Comunidade de Prática, grupo que integra o “Programa Doar para Transformar” (Giving for Change).

A primeira etapa da formação virtual aconteceu na última terça-feira (05/04), e na oportunidade nove organizações e mais de 20 mulheres, entre elas, ativistas, pescadoras, quilombolas, trabalhadoras domésticas, catadoras de mangaba, quebradeiras de coco babaçu, LGBTQIA+, cegas e com baixa visão, trocaram informações e fizeram uma reflexão coletiva sobre os principais desafios sobre reconstruir a sustentabilidade, do campo ético-político, sem perder a identidade e a autonomia na atuação política na sociedade civil.

O primeiro encontro possibilitou que as organizações de mulheres do Nordeste começassem a debater sobre a importância da mobilização de recursos, diversificação de fontes e potenciais parcerias. Carmem Ribeiro, do Grupo Matizes (PI), e Rayovana Santana, do Movimento de Cultura Popular do Subúrbio (BA) abriram os trabalhos com uma Roda de Diálogo sobre os desafios e as perspectivas da sustentabilidade na atual conjuntura política.

As convidadas compartilharam com o grupo suas estratégias para levantar recursos, a exemplo de campanhas, eventos, produção e venda de produtos, parcerias com lojistas e autônomos, e prestação de serviço gratuito por agência de comunicação. Mas, colocaram também os desafios no que diz respeito à falta de recursos para a concretização de suas missões. Carmen Ribeiro chamou atenção sobre a relação com o mundo corporativo: “A busca pela parceria com a iniciativa privada é bastante desafiadora. A Semana do Orgulho de Ser é uma grande ação que traz muita visibilidade e muitas empresas, principalmente as grandes, só querem parceria para tirar vantagem. Até o momento não nos relacionamos com nenhuma”, informa Carmen em não abrir mão dos princípios e valores do Grupo Matizes.

Nesse aspecto dos desafios, Rayovana explica que a mobilização de recursos implica não só fortalecer as dimensões sociopolítica, mas também a técnico-gerencial. Ela explica que a organização interna, a distribuição coletiva de tarefas e cumprimento de prazos são estratégicos para manutenção das ações das organizações: “Ter as certificações em dia e fazer uma prestação de contas, por exemplo, são de extrema importância para continuidade de parcerias, inclusive participar de novos editais.”, informa a participante.

Os movimentos sociais e as organizações da sociedade civil já vinham passando por períodos de crise financeira por conta da conjuntura política, com a pandemia o cenário se agravou. Apesar dos impactos, os movimentos de mulheres se mantiveram ativos para enfrentar os efeitos da Covid-19 e continuar na luta. Com força e criatividade, as mulheres reinventaram suas estratégias por meios digitais, principalmente através das mídias sociais, como descreveu Marinalva Santana, também do Grupo Matizes:

“No início da pandemia, a CESE apoiou o Projeto Gente é pra brilhar para pessoas LGBTQIA+ em situação de vulnerabilidade, por três meses. Após esse período, o recurso acabaria e não conseguiríamos atender todos/as. Tivemos a ideia de turbinar esse projeto nas redes sociais e aplicativos de celular com cards e imagens das distribuições de cestas básicas. Com articulação e muita disseminação, as pessoas se sensibilizaram e em poucos dias arrecadamos quase o valor recebido pela CESE.”, relata Marinalva, que compartilhou também o atrativo para recebimento de muitas doações: “Ofertamos o Livro Letras da Diversidade e máscaras do projeto.”.

As experiências relatadas e atividades em grupo possibilitaram que as mulheres começassem a refletir sobre estratégias para atrair apoiadores/as para suas organizações, além de problematizar quais são as dificuldades e ampliar a visão de que recursos não são apenas financeiros. Para Alícia Morais, da Associação das Catadoras de Mangaba e Indiaroba, o curso chega em um momento muito oportuno para as mulheres organizadas da região Nordeste e descreve as possibilidades propiciadas pela mobilização de recursos locais: “Temos mais autonomia. Ficamos independentes do governo e de recursos internacionais.”, descreve Alícia. E Lívia Ferreira, do Fórum Nacional Marielles Franco, complementa: “Contribui para inclusão e divulgação das comunidades, fortalece o sentimento de pertencimento, e legitima as organizações que compõem os territórios.”, concluiu a representante do Forum Marielles.

A formação, que acontece entre os meses de abril e maio, faz parte do Programa Doar para Transformar (Giving for Change), que possui entre seus propósitos colaborar para a adoção de práticas mais equitativas no sistema internacional de desenvolvimento, inclusive a partir das ideias de mobilização de recursos nacionais e filantropia comunitária.