“Erga a voz em favor dos que não podem defender-se, seja o defensor de todos os desamparados. …
defenda os direitos dos pobres e dos necessitados”. Provérbios 31:8-9
Em tempos sombrios de profunda crise social, política e de saúde pública com uma pandemia que mata milhares de pessoas em todo mundo, a CESE retorna à sua história de organização ecumênica fundada nos tempos de chumbo da ditadura militar para ser uma diaconia de justiça social e de serviço e reafirmar o seu compromisso com a defesa da Vida e da Democracia.
Sua voz se soma às demais instituições democráticas que denunciam publicamente a atitude do presidente que aposta na irresponsabilidade e no caos de sua exposição pública e populista em tempos de pandemia, contrariando orientações básicas de cientistas, de organizações médicas e de saúde e do órgão máximo da ONU, do qual o Brasil é signatário – a Organização Mundial da Saúde. Os indicadores mundiais e no Brasil do avanço da doença são assustadores, mas não para o mandatário maior da nação, que se vangloria arrogantemente de seu poder ao circular publicamente sem qualquer cuidado preventivo, colocando em risco a população e incitando seus seguidores a fazerem o mesmo.
O mundo precisou de 83 dias para conhecer o assustador índice de um milhão de pessoas infectadas pelo coronavírus e apenas mais 14 dias para chegar a 2,5 milhões e mais de 170 mil mortes. No Brasil a pandemia segue em ascensão, com mais de 40 mil casos oficiais e 2600 mortos. Especialistas na área são unânimes em afirmar que há uma subnotificação dos casos e estimam que há, no país, pelo menos um número sete vezes maior de infectados. As próximas semanas de isolamento horizontal serão cruciais para evitar o colapso nos serviços hospitalares, ainda mais neste momento em que a pandemia avança sobre bairros populares e densamente povoados bem como em comunidades tradicionais, a exemplo de quilombolas, pescadores(as), especialmente em povos indígenas onde se registra casos de morte.
A CESE tem apoiado projetos emergenciais em defesa de grupos vulneráveis. Também vem fazendo apelos e divulgado campanhas voltadas ao poder público e para que a população se mantenha, na medida do possível, em suas casas. Se houver necessidade e obrigatoriedade de sair para o trabalho, que exijam dos empregadores a definição de protocolos de segurança específicos para esse momento, além de higienização dos locais de trabalho, distribuição de equipamentos e serviços básicos como fornecimento de água, gel e máscaras de prevenção. De gestores públicos tem orientado que se reivindique transportes higienizados e em quantidade suficiente para os deslocamentos de forma a não haver aglomeração, pressão para um serviço público de saúde eficiente, renda mínima às famílias que mais precisam, sobretudo para desempregados(as) e que pessoas vivem do trabalho informal. A maravilhosa rede de solidariedade dos grupos locais tem sido apoiada e estimulada pela CESE.
Para agravar ainda mais toda a situação que estamos enfrentando assistimos, mais uma vez, com estarrecimento, a participação e apoio do Presidente da República em ato público ocorrido em Brasília no último domingo (19 de abril) na qual os manifestantes desafiaram os poderes constituídos e a democracia ao bradar pelo golpe militar, edição de um novo AI5 e fechamento do Congresso e STF. Citou frases autoritárias conhecidas na história do fascismo: ‘agora é o povo no poder’, ‘não queremos negociar’, ‘o tempo da patifaria acabou’.
Após a longa e terrível jornada que nos levou à redemocratização em 1985 e à Constituinte em 1988, os fatos que se sucederam nos últimos três anos (agravado pela forma como a recente pandemia é encarada por alguns setores privilegiados em nossa desigual sociedade) reforça a triste conclusão que o Brasil ainda não conseguiu efetivar uma democracia plena. Qualquer caminho de volta ao passado seria um profundo retrocesso ao que já foi construído nessa trajetória feita com sofrimento, e também de muitas alegrias.
Em seus 47 anos de história a CESE tem pautado sua trajetória na defesa incondicional do sentido republicano de país e repudia qualquer iniciativa contra a nossa democracia, ainda que esta seja frágil e necessite ser aperfeiçoada. Como organização ecumênica que atua intransigentemente na defesa de direitos, da democracia e das liberdades, as pautas defendidas nesses eventos (e pelo Presidente da República) constituem um escárnio contra os princípios civilizacionais mais elementares e um escândalo que afronta os valores cristãos mais profundos, valores sobre os quais construímos nossa missão, sedimentamos a nossa atuação e alimentamos a nossa esperança. Por esse motivo, expressamos nossa profunda preocupação com os rumos do país e cobramos uma postura firme e resoluta do Congresso Nacional para garantir que as estruturas que alicerçam o edifício democrático do país não sejam abaladas por movimentos dessa natureza.
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