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No Brasil, a crise sanitária, política e econômica agravada pela pandemia da COVID19 se alastram diariamente. Todos os dias, brasileiros/as precisam enfrentar a falta de acesso aos direitos básicos e o aprofundamento da desigualdade, que torna a sobrevivência mais difícil para mulheres, negros/as, indígena e camponeses.

Após se propagar pelas metrópoles e grandes centros urbanos do país, a SARS-CoV-2, causadora da COVID-19, começa a chegar de forma acelerada nas cidades de menor porte do país. Segundo uma pesquisa realizada pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) com dados de pesquisa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), houve um aumento significativo de aproximadamente 50% de novos casos, nos municípios que têm de 20 a 50 mil habitantes.

Além de dispor de menor capacidade de serviços de saúde com a interiorização da pandemia, trabalhadores/as rurais têm seus problemas intensificados com complicações de acesso a créditos, falta de políticas públicas de um modo geral e dificuldades no escoamento da produção por conta das medidas de isolamento.

Frente a essa realidade, encontra-se o município de Queimadas, situado no semiárido da Bahia, a aproximadamente 300 km de distância da capital, que tem como principal característica o modo de vida das pessoas que sobrevivem através do trabalho no campo.  Neste contexto está a comunidade de Lagoinha, que sofre os efeitos dramáticos com a chegada da pandemia. Com o aumento do número de infectados/as, houve a necessidade de seguir as recomendações de isolamento social e fechamento do comércio, o que ocasionou um prejuízo financeiro significativo e uma queda na economia municipal e das comunidades rurais vizinhas.

A partir desse cenário, a CESE e a Associação dos Moradores e Produtores de Lagoinha (AMOPROL) juntaram-se, através da Metodologia Dupla Participação, com o objetivo de fortalecer as famílias mais vulneráveis da comunidade neste momento de isolamento social, levando informações de combate ao Coronavírus, distribuindo alimentos e produtos de proteção, higiene e limpeza, e garantindo aos agricultores/as o plantio das culturas de milho e feijão.

Para Jackson Diego dos Santos, secretário da Associação dos Moradores e Produtores de Lagoinha, ações como essas são extremamente necessárias em um contexto de pandemia. Para ele, a questão de acesso ao crédito é um dos principais problemas enfrentados na região de Queimadas (BA). É algo intensificado com a crise e que precisa de medidas e ações estruturantes para o segmento responsável por levar 70% dos alimentos aos brasileiros/as: “Há necessidade de recursos financeiros para melhoramento do rebanho dos animais, ampliação de cercas e plantio de palmas, entre outras demandas. Os/a agricultores não conseguem acessar o Agroamigo [Programa de Microcrédito Rural do Banco do Nordeste], por conta de problemas burocráticos com documentos retidos em órgãos como o Fórum, Secretaria de Agricultura e Sindicatos dos Trabalhadores Rurais. Além disso, agentes de créditos do banco estão atuando de forma virtual, o que dificulta a vida de muitos trabalhadores/as semianalfabetos/as do município.”, afirma Santos.

Medidas anunciadas pelo Governo Federal como uma linha de crédito emergencial para produtores/as durante a pandemia, se esbarram também nas condições para execução. O valor apresentado de até R$20 mil por pessoa, possui juros de 4,6% acima da SELIC (Sistema Especial de Liquidação e Custódia), taxa básica de juros da economia do país, que corresponde 3,75%. Além disso, os bancos assumem exclusivamente os riscos em caso de inadimplência.

Para Aristides Santos, presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares (CONTAG), esse crédito é inviável para a maioria dos agricultores: “Você está dizendo que lançou o crédito, mas o trabalhador não vai acessar. Por dois motivos: um que o banco não vai fazer e, no que o banco topar fazer, o trabalhador vai ter dificuldade de pagar o juro maior. Se acessar, não parece tão emergencial assim, porque isso não é juro emergencial. Juro emergencial é juro zero, é rebate para incentivar o pagamento com adimplência. Isso é emergencial”, define Santos em entrevista cedida a Agência Envolverde Jornalismo.

Agricultores familiares ainda esperam que medidas emergenciais anunciadas pelo governo federal para enfrentar a pandemia cheguem de fato as zonas rurais, como a comunidade de Lagoinha, exemplifica França Lima, tesoureiro da AMOPROL: “As associações e pequenos grupos produtivos do nosso município precisam do suporte, tanto na área técnica quanto financeira, ofertadas tanto pelo Estado quanto pela União, apoio através de Políticas públicas. No entanto, nenhuma ação tem sido feita até o momento. Esperamos que em breve seja manifestado um olhar para as classes produtivas referentes ao melhoramento da produtividade”, afirma França.

Enquanto os recursos e as políticas públicas não chegam à comunidade Lagoinha, que abriga cerca de 100 famílias de agricultores/as e produtores/as rurais, a AMOPROL tem atuado junto à pessoas que historicamente se debruçam no enfrentamento das mais diversas situações para garantir os meios de vida de suas famílias e os direitos fundamentais. Através das ações locais de mobilização de recursos realizadas anteriormente a pandemia, como festival de jogos, bingos e doações de pessoas físicas, a comunidade destinou R$5 mil para o projeto “Juntos e distantes vamos vencer”. E com a Metodologia Dupla Participação, a CESE apoiou mais R$5 mil.

Além da distribuição de 100 kits de alimentação e produtos de limpeza/higiene para as famílias em situação de vulnerabilidade, a associação realizou uma campanha para aquisição de sementes de milho e feijão para a comunidade. A iniciativa tem como objetivo distribuir esses grãos para produtores/as locais para a formação de um banco de sementes, a fim de assegurar autonomia aos agricultores/as familiares e resgatar laços de ajuda mútua em Lagoinha.

França Lima fala sobre a importância do apoio da CESE nesse momento: “Conseguimos amenizar as dificuldades vivenciadas pelas famílias que vivem abaixo da linha da pobreza. A CESE iluminou nossas vidas ajudando a realizar esse projeto com grande valia. Reconhecemos o empenho, a contribuição da organização, e sabemos o quanto é importante ter ao nosso lado uma entidade com uma visão voltada para projetos que mudam vidas.”, enfatiza o representante da AMOPROL.

Para a associação, o pós pandemia pode ser um período para que pautas caras das populações do campo possam ser colocadas em debate, como a resistência das muitas famílias ao modelo do agronegócio. Nesse sentido, a AMOPROL tem se articulado virtualmente com outras entidades e comunidades para fortalecer a agricultura familiar e consumo de alimentos sem veneno: “Estamos nos articulando para a 7ª Edição da Expo Feira de Caprinos e Ovinos da região, após a pandemia. Acreditamos que será um momento oportuno para os debates voltados para as questões do semiárido, em especial o fortalecimento da agricultura familiar. Temos contatos em média com 12 comunidades do entorno que realizam basicamente as mesmas atividades. Queremos fortalecer a produção agrícola com produtos de qualidades no segmento orgânicos.”, informa Jackson Diego dos Santos.